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Franci, nikkei brasileira de destaque no Brasil, EUA e Japão: “A música é minha linguagem”

As conversas com meu pai eram em japonês

“Quando criança, eu era retraída e não tinha jeito para ficar frente a frente com as pessoas”. Assim fala Franci que atualmente se apresenta nos palcos do mundo com sua voz angelical, mas que se achava um “patinho feio” na sua fase de menina. Nikkei de segunda geração nascida e criada em São Paulo, é a segunda das três filhas que seus pais tiveram – ele originário da província de Miyazaki e que veio criança para o Brasil e ela da província de Shizuoka.

Desde tenra idade, Franci e as irmãs conversavam com o pai somente em japonês. “Se eu começava a falar em português, ele nem respondia”, diz ela. Seu pai desejava que as filhas se familiarizassem com a língua japonesa desde cedo. Depois das aulas na escola, Franci trocava para uniforme e se dirigia à escola de língua japonesa. À noite ia à aula de balé e, quando retornava à casa, passava das 9 da noite.

“Tinha personalidade dócil, mas não gostava de perder. Penso que foi por influência de meu pai”, diz ela.

O pai de Franci sofreu um acidente de trânsito aos 34 anos de idade, o que lhe causou danos na medula espinhal, ficando paraplégico. Depois disso, dedicou-se ao tênis de mesa por poder praticar na posição sentada, participou em duas paraolimpíadas e realizou-se profissionalmente administrando uma loja de móveis.

Franci conta que seu pai costumava ficar perto, enquanto ela fazia as tarefas escolares tarde da noite. Conversavam sobre vários assuntos e ele sempre foi um grande incentivador. Por outro lado, com a sua mãe conversava em português: “Minha mãe era uma pessoa aberta, convivia bem com todos, não se importando com as diferenças raciais”.


Como comissária de bordo da Varig

Quando estudante do ensino médio, Franci venceu um concurso nacional de oratória. O título era “A força da palavra”. E começando com a palavra Arigato, ela discorreu com ardor sobre quão grande é o significado de cada palavra que dirigimos às pessoas. Mas não foi iniciativa sua. “Fui designada pelo professor e, uma vez selecionada para participar desse certame, preparei-me da melhor forma”.

Concluído o ensino médio, ingressou na Universidade de São Paulo. Ainda estava cursando, quando foi para o Japão como bolsista na Universidade de Línguas Estrangeiras de Osaka, onde ficou um ano. Retornou ao Brasil e, quando estava no 4º ano da faculdade, foi aprovada no exame para preenchimento de vaga na companhia aérea brasileira Varig. Houve duas razões para escolher uma companhia aérea: por poder viajar, não somente pelo Brasil, mas para outros países também e pela oportunidade de usar o português e o japonês e também o inglês que aprendeu nos três meses que passou nos Estados Unidos, aproveitando as férias de inverno quando cursava o ensino médio.

A companhia aérea Varig era na década de 1990 uma empresa muito conhecida, havendo candidatas até do exterior, portanto, Franci passou por uma série de entrevistas e exames até ser oficialmente aprovada. Além do mais, faltava cursar o último ano da faculdade.

“Achei que deveria primeiro me formar, então, passei a fazer a rota São Paulo – Rio de Janeiro e, após o trabalho, ia assistir às aulas do curso noturno e, na manhã seguinte, saía do dormitório universitário direto para o trabalho, rotina que continuou por um tempo”, relembra Franci.

Logo após concluir a faculdade, mudou-se do Brasil, pois sua base tornou-se Los Angeles.  Nessa época, um grande número de decasséguis da América Latina se dirigia ao Japão e Franci ficou encarregada da rota São Paulo – Los Angeles e Los Angeles – Tóquio. E quando foi inaugurada a rota São Paulo – Nagoia via Los Angeles, ela foi escolhida para atuar no anúncio publicitário da Varig.

Foi uma época em que esteve atarefada, fazendo uso do seu conhecimento de línguas e tudo caminhava bem, mas depois de cinco anos ela deixou esse trabalho. “Além de sofrer de dor lombar que dizem ser uma doença do trabalho, achei que poderia procurar algo para o qual eu tivesse vocação”, relembra ela.


Três países, três pátrias

Que trabalho seria esse? Por influência de sua irmã mais velha que apreciava música, Franci participou de um concurso sagrando-se vencedora. Logo depois, um produtor musical japonês que a tinha ouvido, fez-lhe um convite para ir ao Japão.

Álbum “Symphony of My Dreams”

No mundo da música, Franci produziu um álbum de música New Age e, após conhecer o músico e compositor Kitaro, escreveu a letra para suas melodias e gravou um álbum, onde ela também canta – Symphony of My Dreams lançado nos Estados Unidos e no Japão. Atualmente está empenhada nos preparativos de um projeto que visa ao renascimento da música brasileira, contando com a colaboração de um grande nome da música erudita brasileira, maestro Amilson Godoy.

“Desde criança, eu não tinha jeito para falar em público, mas agora eu quero alcançar o coração das pessoas através da música. Levei tempo para chegar até aqui, mas a música foi a melhor forma que encontrei para me expressar”.

Atualmente, Franci desenvolve seu trabalho com base em três capitais: Los Angeles, Tóquio e São Paulo. Perguntei-lhe em qual desses lugares ela se sente melhor. “Estando no Japão, penso que realmente sou brasileira; no Brasil, se me comparar com o brasileiro tipicamente alegre, eu me considero mais japonesa e em Los Angeles posso viver sendo eu mesma. Mas eu me sinto bem nos três lugares. Meu pai disse que o bom é fazer de cada um desses países a minha pátria”. De fato, Franci fala a língua dos três países e dispõe de um meio de expressão universal que é a música, podendo viver bem em qualquer lugar. O patinho feio que se transformou em cisne branco está voando livremente pelo mundo.

“O que lhe vem à cabeça ao ouvir a palavra Brasil?” e ela responde com olhar tristonho: “Família”. Justamente pelo fato de viver grande parte do tempo longe de seu país, Franci deve sentir uma gratidão profunda pela terra natal e pela família.

Com o grande nome da música brasileira, maestro Amilson Godoy

* Website de Franci: www.francisongs.com

 

© 2015 Keiko Fukuda

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About the Author

Keiko Fukuda nasceu na província de Oita, se formou na Universidade Católica Internacional e trabalhou num editorial de revistas informativas em Tókio. Em 1992 imigrou aos EUA e trabalhou como editora chefe numa revista dedicada a comunidade japonesa. Em 2003 decidiu trabalhar como ¨free-lance¨ e, atualmente, escreve artigos para revistas focalizando entrevistas a personalidades.  Publicou junto a outros escritores o “Nihon ni Umarete” (Nascido no Japão) da editora Hankyuu Comunicações. Website: https://angeleno.net 

Atualizado em julho de 2020 

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