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A Cooperativa de Cotia e seu importante papel na expansão agrícola no Brasil

Em um momento em que a história apresentava um cenário favorável, o crescimento da cidade de São Paulo e a consequente mudança de rotina dos paulistanos, surgiu a Cooperativa Agrícola de Cotia (CAC). Uma das maiores cooperativas brasileiras, a CAC contribuiu para o cultivo de batata, soja, uva, manga e café, além da produção de ovo e frango.

O surgimento das cooperativas agrícolas

De acordo com a historiadora Célia Sakurai, “vieram as famílias japonesas para o Brasil que depois daqueles anos de contrato nas fazendas de café adquiriram pedaços pequenos de terra”. E a sobrevivência dessas famílias dependia da produção vinda dessa terra.

Formaram-se, assim, as colônias, as pequenas propriedades agrupadas em algumas localidades, porque os terrenos eram todos vizinhos.Essa vizinhança proporcionou a possibilidade de abrir escola, associação, etc. Portanto, a vida girava em torno dessas novas comunidades.

Em geral, como essas colônias estavam localizadas em uma determinada região, produzia-se a mesma coisa. É o caso do algodão, de algumas fazendas de café, pequenos produtores e do chá em Registro, interior de São Paulo.

Um dos maiores destaques na história das cooperativas é a Cooperativa de Cotia, na Grande São Paulo, onde as famílias começaram a produzir batata. São pequenos produtores que depois começaram a se unir para vender em São Paulo. “O papel da cooperativa não é o de produção, mas o de comercialização. Porque cada família produzia na sua própria terra e a comercialização é que era difícil”, conta a historiadora.

O cultivo de batata começou em Cotia e outras áreas nos arredores de São Paulo (foto: Acervo do Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil)

“Hoje onde é o Largo da Batata, em Pinheiros, era o lugar para onde, então, os produtores de Cotia levavam essa batata para se comercializar na cidade de São Paulo”. Lá começou a surgir esse pequeno centro de comercialização de batata, que aos poucos foi crescendo, e gerou certa descentralização do comércio de alimentos na cidade, porque não necessariamente acontecia no Mercado Central.

Expansão: de Cotia para o Brasil

A produção começou em Cotia e depois foi se expandindo para outros lugares, como o interior de São Paulo, porque o sistema de cooperativa facilitava o escoamento de produtos.

Um desdobramento da Cooperativa de Cotia é a produção de ovos. Como o mercado de Cotia era muito pequeno, esses pequenos granjeiros começaram, então, a se reunir para produzir ovos e vendê-los para a cidade de São Paulo.O que facilitava era o fato de as cidades estarem próximas uma da outra.

Além dos ovos, começaram a criar frango a partir de algumas matrizes que foram trazidas do Japão. A batata – que passou por um processo de melhoramento e, por isso, foram desenvolvidas técnicas de combate à praga, entre outros – o ovo e o frango foram os três principais produtos que aproveitaram o mercado da cidade de São Paulo. Na década de 1930, começo de 40, é um momento em que a cidade está crescendo e por isso a Cooperativa deu certo.

Até a década de 30, as pessoas comiam o ovo da galinha que criavam no quintal.Porém, com o crescimento da cidade, e consequentemente com atividades que não deixavam tempo para as pessoas produzirem a própria comida, havia a necessidade de frequentar lugares para poder comprar esses produtos. “Foi justamente na época em que os japoneses vieram para São Paulo e começaram, então, a vender esses produtos que antes eram parte do cotidiano das donas de casa”, explica. O mesmo aconteceu com os feirantes que vendiam verduras.

Mais tarde, já na década de 60, começo de 70, a expansão da cooperativa chega a outras regiões do Brasil. Esta já é outra face do trabalho da cooperativa, que é abrir novas fronteiras.

Na década de 60-70, na época do governo militar, era interessante criar novas fronteiras de assentamento de pessoas que até então não estavam dentro do mapa econômico brasileiro, como, por exemplo, a região do cerrado.

Os militares cederam um pedaço de terra para a Cooperativa de Cotia, que fez um bloco experimental na cidade de São Gotardo, em Minas Gerais. Os agricultores começaram com um projeto piloto, tentando várias culturas.Hoje, tem-se o café do cerrado e se planta trigo e soja, produtos que começaram a ser testados pelos técnicos da cooperativa.“A Cooperativa teve uma parcela fantástica para produzir as matrizes de muda de soja e hoje estão espalhadas pelo Brasil inteiro”, opina.

A CAC teve um polo no oeste da Bahia, em Barreiras, que conta com uma grande produção de soja. Hoje produz bastante uva e manga, para exportação, além de vinho produzido no vale do Rio São Francisco. Tudo isso também foi projeto do governo militar junto com a segunda geração de famílias japonesas (a primeira geração foi aquela que se dedicou à batata, frango, ovo), que foi para algumas regiões meio inabitadas ou pouco econômicas para testar algumas culturas.

Além disso, a Cooperativa de Cotia se expandiu para os arredores do Rio de Janeiro e criou um entreposto para abastecer a cidade.

Sucesso das cooperativas

Célia Sakurai afirma que os japoneses contribuíram bastante para quebrar com o sistema latifundiário, com a ideia de que agricultura é igual a grande propriedade. A pequena propriedade, ou a média propriedade, produz e pode também ser rentável.

Hoje existe uma população urbana, onde vivem pessoas com os mais variados tipos de trabalho. Assim, para a historiadora, a imigração japonesa teve sucesso para a opinião pública brasileira por uma coincidência histórica. Os japoneses chegaram a São Paulo – que já na década de 1920-30 era a locomotiva do Brasil por causa do café –, o que de alguma forma favoreceu essa ascensão social, que começou na agricultura e com a organização de cooperativa que era completamente desconhecida pelos brasileiros.

A ideia de cooperativa, de ajuda mútua, sempre existiu no Japão e os imigrantes trouxeram isso de lá.Foi até “natural” que essa primeira geração se organizasse nesses grupos comunitários e, depois, se foi ensinando para as gerações seguintes.

Assim que se estabeleceram, os imigrantes já deixavam de sonhar em voltar ao Japão, porque “o Brasil, apesar de todos os apesares, abria possibilidades de se escolher. Você podia escolher para onde queria ir. Podia comprar terra, escolhia onde queria”. Já no Japão a opção de escolha era muito mais restrita.

Comunidade

“De 1928 até 1960, começo de 70, os japoneses criaram em torno de si uma aura de que são grandes produtores, bons agricultores, porque são organizados, trabalhadores”, conta. Existe, então, um estereótipo de que os japoneses são ótimos trabalhadores, ótimos agricultores, e que são confiáveis.

Esse estereótipo surgiu porque o processo de ascensão social era visível. “Daquele pequeno pedaço de terra se produzia e trabalhava, os filhos estudavam, comprava-se uma casa melhor”.Era outra mentalidade e que tinha foco na ideia de se tornar proprietário de terra.

Outro ponto que envolvia a comunidade era o fato de a cooperativa ter uma ideia parecida com a do kaikan,uma associação, em que todos ajudam e participam de atividades em grupo. As associações também ajudam a construir escolas, pagam professores, com o objetivo de ter algo comunitário e que dá certo. É “um trajeto que vem do Japão e continua no Brasil”, completa a historiadora.

Cooperativa Agrícola de Cotia

Criada em dezembro de 1927 sob o nome de Sociedade Cooperativa de Responsabilidade Limitada de Produtores de Batata em Cotia S/A, a cooperativa contava com 83 agricultores.

A Cooperativa Agrícola de Cotia, fundada em 1927, foi uma das cooperativas mais importantes do Brasil (foto: Acervo do Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil)

Até 1942, se destacou entre as demais empresas do setor, diversificando sua produção ao comercializar outros produtos, como frutas, ovos, grãos, aves, hortaliças, chá, algodão e legumes.

Já sua expansão ocorreu a partir do fim da década de 1930 para todo o Estado de São Paulo, o município do Rio de Janeiro, o Paraná e Minas Gerais.

Com 60 anos de existência, em 1987, a CAC já atuava em 15 estados, com dez cooperativas ligadas à central, 90 depósitos regionais, além de 15 mil associados e faturamento anual de 760 milhões de dólares.

Em 1994, cooperativa decidiu a dissolução por livre arbítrio e, quatro anos depois, os arquivos da cooperativa foram doados ao Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil, em São Paulo.

Referência:

TANIGUTI, G.T. "Cotia: Imigração, Política e Cultura". Tese (Doutorado). Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, São Paulo, 2015.

 

© 2017 Tatiana Maebuchi

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About the Author

Nascida na cidade de São Paulo, é brasileira descendente de japoneses de terceira geração por parte de mãe e de quarta geração por parte de pai. É jornalista formada pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e blogueira de viagens. Trabalhou em redação de revistas, sites e assessoria de imprensa. Fez parte da equipe de Comunicação da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social (Bunkyo), contribuindo para a divulgação da cultura japonesa.

Atualizado em julho de 2015

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