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Os decasséguis estão voltando. Japão agradece.

Encanto de Tóquio à noite

“Sr. Higuchi, li a notícia que o Japão necessitará de mais de 300 mil trabalhadores estrangeiros nos próximos cinco anos. O senhor acha que vale a pena trabalhar no Japão?”, perguntou-me um Nikkei sênior que parecia me conhecer, enquanto eu aguardava o início da palestra “ A Comunidade Brasileira no Japão”, pelo emérito professor da Universidade de Shizuoka –Shigehiro Ikegami – na Japan House de São Paulo, dia 20 de fevereiro último.

A pergunta feita de forma tão informal e abrupta merece uma reflexão antes de ser respondida. Se o objetivo primordial é puramente econômico, ou seja, de ganhar dinheiro, economizando o que puder e voltar ao Brasil com uma reserva razoável que possibilite ao trabalhador adquirir sua casa própria ou dar início a uma atividade como empreendedor, não me parece um momento favorável. No mínimo, mereceria do interessado uma avaliação maior dos prós e contras.
 

Bons Tempos

Comparando-se à situação de vinte ou trinta anos atrás, quando a economia japonesa navegava em águas mais tranquilas e abria as portas para os decasséguis brasileiros, a remuneração que se pagava era mais atraente, as horas extras eram mais volumosas. Atualmente, os ganhos reais diminuíram e as horas extras, o “plus” que atraía os trabalhadores e significava um considerável reforço no bolso todo mês, tornaram-se mais escassas, diminuíram ou, em alguns casos, sumiram. De tal forma que para ter uma sobra e gerar uma poupança no final de cada mês, só aconteceria à custa de enorme esforço e sacrifício. Viveria para trabalhar, tão somente! Nada de lazer, viagem, restaurantes. Será que valeria a pena?

Por outro lado, se a decisão extrema e necessária de mudar-se para o Japão for em decorrência não apenas da falta de opção de trabalho aqui no Brasil, mas fruto de uma avaliação profunda e bem pensada, priorizando, principalmente, a melhoria na qualidade de vida e considerando até uma longa permanência, posso afiançar que a mudança valerá a pena, terá muitas condições de dar certo.

Já dizia um veterano decasségui brasileiro: “No Japão, mesmo em emprego menos qualificado você consegue viver razoavelmente, não precisa de tantos recursos para ter segurança, educação, saúde e até lazer!”

Tenho vários parentes e amigos que confirmam essa assertiva. Foram para lá com a família toda, até com crianças pequenas ou constituíram um lar depois de uma permanência de quase 30 anos e se adaptaram de tal forma que a ideia de retornar ao Brasil é coisa do passado. Conseguiram adquirir casa própria, os filhos já se casaram, alguns até com japonesas (nativas), surgiram os netos e a mais valiosa das conquistas: o ingresso de algum jovem membro da família na universidade local, passo importante para a ascensão na fechada sociedade japonesa. Esse feito dos jovens aprovados nas escolas superiores do Japão, embora ainda de forma tímida, vem ocorrendo com consistência nos últimos anos, fato destacado e ressaltado pelo Prof. Ikegami em sua palestra. 

Famíliade dekasseguis bem sucedida no Japão
 

Os decasséguis estão voltando

Nesse sentido, não deixa de ser relevante a notícia que o número de decasséguis volta a crescer no Japão após dez anos de retração. Vem coincidir com o aumento do desemprego no Brasil e a necessidade quase desesperada que o Japão tem, atualmente, de atender a sua demanda por mão de obra.

Entre 1989 e 2018 ocorreram três grandes fluxos de emigrantes brasileiros – decasséguis – para o Japão. Entre 1989 e 2000, ocorreu uma forte crise no Brasil, com aumento do desemprego e consequente aumento de decasséguis no Japão, chegando a aproximadamente 150.000 nikkeis brasileiros em 1993. O desemprego aqui cresceu até 2000 e o número de decasséguis subiu para quase 300.000 em 2005. Com a grave crise econômica mundial em 2008, ocorreu o inverso com centenas de decasséguis sendo obrigados a retornar ao Brasil, caindo para 180.000 o número de decasséguis no Japão em 2013. Com a nova e recente crise em nosso país, desde 2015 os nikkeis brasileiros vem procurando o Japão para trabalhar. Aumentando gradativamente, esse número chegou a 191.000 em 2018, segundo dados do Consulado Geral do Brasil em Tóquio.

Essa demanda coincide com a necessidade que o Japão tem de atrair mais de 300 mil trabalhadores estrangeiros nos próximos cinco anos, conforme proposta apresentada recentemente pelo primeiro-ministro japonês Shinzo Abe.
 

Japão está diminuindo

Não é surpresa para ninguém a crise demográfica que está ocorrendo no Japão. Ela é conhecida e prevista há muito tempo. A população do Japão está envelhecendo rapidamente e encolhendo. Trinta por cento da população japonesa é constituída de idosos e esse contingente deverá subir ainda mais, para cerca de 40% em 2050. Que, somando à sua baixíssima taxa de natalidade, provocam esse fenômeno da diminuição da população japonesa ativa. Houve uma redução de quase um milhão de pessoas entre 2010 e 2015, e em 2018, caiu mais 200 mil.

Para agravar ainda mais a situação, há um crescente aumento de turistas estrangeiros visitando o Japão que, somado às obras e os preparativos intensos para a realização dos Jogos Olímpicos de Tóquio em 2020, resultam nessa aguda necessidade de mão de obra nos próximos anos.
 

Procuram-se trabalhadores

Segundo estimativas oficiais há 160 vagas para cada 100 trabalhadores. Ou seja, há muitas vagas disponíveis que os japoneses nativos mais velhos não podem desempenhar e os mais jovens não querem e não se interessam em fazer. Daí o enorme problema que o governo japonês está buscando equacionar e, para isso, indo contra sua própria tradição de um país que sempre evitou a imigração, ferozmente isolacionista que foi até meados do século 19. Mas, o Japão está mudando, está tendo que se modernizar de forma acelerada. Podemos confessar que se trata de uma questão até de sobrevivência para o país nipônico.

Segundo o Prof. Ikegami, a passagem do tempo também se faz sentir entre os membros das primeiras ondas de decasséguis que seguiram para o país nipônico. Aqueles que foram para lá com 18, 25, 30 anos, hoje estão com 40, 50 ou 60 anos. Mais experientes, mais adaptados, mas mais envelhecidos. Entre os decasséguis também há necessidade de renovação. 

São mais de 300 mil vagas que estarão disponíveis, mas acautelem-se os nikkeis brasileiros que estão sonhando em mudar-se para o fascinante país de seus antepassados. É preciso ter consciência das dificuldades que enfrentarão. No Japão “o trabalho duro é valorizado e as regras devem ser obedecidas”! “É preciso ir com um mínimo de conhecimento da cultura local e das normas da vida diária”.

E, estar preparado para a concorrência que sofrerão pela disputa de uma vaga. Chineses, coreanos, filipinos e vietnamitas, entre outras, estão cada vez mais presentes nesse Japão internacionalizado, não apenas como turistas, mas trabalhando na indústria, comércio e serviços.
 

Conselho, não! Recomendação

Para encerrar, gostaria de voltar à pergunta inicial do amigo nikkei, comentando que se você quer trabalhar e viver no país onde quase tudo funciona e bem, onde há ordem e disciplina, onde quem trabalha tem vida digna, onde há respeito, oportunidade de trabalho, educação de qualidade, vida saudável e onde não há violência. Tudo isso você encontra no Japão.

Não é um país perfeito! Tem alguns defeitos (excesso de trabalho, idioma, costume, entre outros), mas quem conheceu, gostou muito!

Quem tem que fazer essa escolha é você! Decida onde quer chegar e uma vez decidido, não pare até alcançar. Acho que valerá a pena!

Boa sorte!

 

© 2019 Katsuo Higuchi

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About the Author

Natural de Tupã – SP, nissei, formado em Direito com Especialização em Relações Trabalhistas. Durante 50 anos atuou como Executivo e Empresário na área de Recursos Humanos. Consultor Empresarial, é  também Colunista do Jornal Nippo Brasil.

Atualizado em junho de 2017

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