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Astro

"Exploding Stars" Por Russell Auld

Na primeira vez que visitei a cidade do Rio de Janeiro, percebi que havia algo um pouco diferente por lá. Na segunda, quando fiquei por mais tempo, confirmei o que havia percebido e o que havia escutado de alguns parentes: o carioca adora japonês.

Não o carioca adulto e sim o carioca criança.

Sou prova de que os carioquinhas não podem ver um japonês – ou descendente de japonês, como é o meu caso – que eles ficam logo alvoroçados.

Quando eu cheguei na cidade – em minha segunda vez –, ainda no táxi, vi alguns garotinhos que passaram a sorrir só por me verem ali, parado no trânsito. Eles estavam na calçada. Acenei com a mão.

Logo em seguida, ao sair do hotel, fui abordado por duas garotinhas que falavam comigo como se eu não as entendesse. E como eu ainda não entendia o que estava acontecendo – cheguei a imaginar que isso fosse uma daquelas pegadinhas bem elaboradas –, fiz que não as entendia mesmo.

Aí elas passaram a tentar falar comigo em inglês, olha só! Mas, como eu achei isso muito engraçado, continuei não falando, só rindo. Então elas voltaram ao português e começaram a berrar: “HEIN, MOÇO, VOCÊ É JAPONEIS OU NÃO??? FALA, VAI!!!”

“Sou japonês, mas não sou surdo!!!”, disse a elas – com simpatia, é claro. Ficaram espantadas com o fato de eu saber falar português.

No calçadão de Copacabana a coisa continuou. Um rapaz que andava de bicicleta – no outro lado da avenida Atlântica! –, ao me ver tomando água de coco num quiosque, não se conteve e me acenou: “Ô, JAPONEIS!!!

Outro dia, perto de uma comunidade da zona norte, alguns jovens, pensando que eu fosse enviado de algum jornal do Japão, ;passaram a me mandar coraçõezinhos – juntando as duas mãos em concha – para que eu os fotografasse.

Ah, essa é a melhor: em um fim de tarde, eu estava andando na areia da Barra da Tijuca e percebi que um menino vinha correndo em minha direção. Quando ele estava bem próximo a mim, ouvi o pai dele gritar: “Moleque, deixa o gringo em paz!!! Quê que é isso?!?”

Com o passar do tempo, quando me perguntavam se eu era japonês, eu respondia com outra pergunta; só que galhofeira: “Sim, sou japoneis. E você, também é japoneis?”

E o quê é que a maioria delas me respondeu?

“Ei, cê não tá me vendo, não, tio??? Eu sou normal!!!”

Quando me acostumei totalmente com o assédio, passei a responder, automaticamente, que eu era brasileiro, igualzinho a elas, nascido no Brasil. Mas elas ficavam melancólicas: - Ah... Ah... mas você nem parece brasileiro...

Quando minha pele ficou com o famoso bronzeado carioca, passei a dizer a elas que eu era descendente de índios. Mas isso foi ainda pior: “Japoneis-índio!?!”

No final tentei me disfarçar para conseguir privacidade. Então passei a usar óculos escuros. Dia e noite. Mas, mesmo assim, eu era reconhecido.

Enfim, caro leitor, por mais que eu tentasse, nada adiantou. Eu era mesmo um astro na cidade dos astros da televisão.

Claro, as crianças não estavam admiradas pelo fato de eu ser descendente de japonês. Elas só estavam curiosas por causa disso e, principalmente, achando muita, mas muita, graça disso – o que, convenhamos é melhor do que se elas tivessem sentido ódio por causa disso.

Por fim, só depois que conheci o Rio de Janeiro é que fui entender a grande quantidade de descendentes de japonês que apresenta programa infantil na televisão brasileira. Só as crianças cariocas já é garantia de um bom IBOPE.

E é por isso que... É... Hum... É... E é por isso que, aproveitando que eu já estava por lá, deixei o meu currículo... na portaria da Rede Globo. Quem sabe, né?

 

© 2017 Hudson Okada

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About the Author

Udê, ou Hudson Okada, nasceu na cidade de Matão-SP, no dia 02 de agosto de 1979. Mora em São Paulo desde 2005. É neto de japoneses e adora escrever sobre a cultura nikkei.

Faz parte do time de colaboradores do site Descubra Nikkei e do site Tempos Crônicos.



Atualizado em abril de 2017

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