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Uchina Mensoore - Bem-vindo a Okinawa

Faça chuva ou faça sol, nada impede que grupos de Rádio Taissô se reúnam diariamente na tradicional Praça da Liberdade em São Paulo para praticar a ginástica comunitária. Evento que ocorre também em vários outros locais, até em outras cidades. A música instrumental ao fundo, que ecoa através do alto falante, dita o ritmo dos movimentos leves e harmoniosos que dezenas de pessoas, compenetradas e animadas, se põem a fazer. Vestidas à caráter, com roupa de ginástica toda branca, inclusive tênis, desenvolvem uma série de exercícios físicos que servem para prevenir o sedentarismo, o estresse e o envelhecimento precoce, prejudiciais à saúde e ao bem-estar. Da Terceira Idade em sua maioria, todas buscam viver mais e com qualidade de vida e essa tem sido a preocupação de um número maior de brasileiros conscientes, que querem chegar à velhice com dignidade e mais saúde, numa época em que a expectativa de vida só tende a crescer.

Segundo previsão de especialistas, até 2050 a população de idosos deverá triplicar no Brasil, devendo atingir 60 milhões de indivíduos, superando a de crianças brasileiras.

Chegar à velhice de forma saudável e com lucidez nada mais é que o reflexo de uma atitude comportamental, de respeito à própria saúde e modo de viver.  É, na verdade, um direito do cidadão.

A longevidade

E, por que algumas pessoas conseguem chegar aos 90, 100 anos e até muito mais? Obviamente, chegar a essa provecta idade com saúde e disposição, reforçamos. Será influência de fator genético ou haverá outras imponderáveis razões que levem alguns privilegiados a viverem mais?

Nesta semana, a senhorinha Aiko Higuchi, de São Paulo, que completará 99 anos em janeiro próximo, foi entrevistada e avaliada por um grupo de pesquisadores, doutores em biociências da USP, a renomada Universidade de São Paulo, que desenvolve uma pesquisa sobre o Genoma Humano e Células-Tronco. Liderado pela eminente Doutora Mayana Zats, o grupo de trabalho busca descobrir as razões do envelhecimento saudável e se a longevidade recebe, entre outros fatores, influência de ordem genética.

D. Aiko e a equipe de pesquisadores-Doutores da USP.

Os pesquisadores ficaram admirados pela lucidez, disposição física e bom humor apresentados pela D. Aiko.

É possível que haja uma certa conexão, em alguns casos, mas tudo leva a crer que a longevidade é mais resultado de atitudes comportamentais, do cuidado e da postura proativa que o cidadão tem com a sua saúde e com a sua vida, de maneira ampla.

Vejamos, por exemplo, a mítica longevidade dos habitantes da Ilha de Okinawa.

Essa Ilha ao Sul do Japão ficou conhecida por ter a maior população de pessoas acima de cem anos no mundo inteiro.

Os segredos da longevidade em Okinawa já foram objetos de muito estudo e pesquisa e levaram muitos estudiosos até a Ilha em busca da fórmula mágica da longa vida.

Pode ser que o clima agradável da região, bem mais quente que no restante do Japão e o modo de vida mais tranquilo dos habitantes tenham influência, mas os estudos demonstram que há outras razões igualmente importantes que levam muitos de seus habitantes a alcançarem idades tão avançadas.

Escritores, como Héctor Garcia e Francesc Miralles, autores do livro IKIGAI – Viva bem até os cem anos e outros como Makoto Suzuki e Bradley Wilcox, após longa e meticulosa pesquisa e análise para entender como os habitantes da Ilha vivem tanto e tão bem, resumiram os princípios fundamentais para se chegar à felicidade conseguida pelos centenários dessa região.

O segredo da Ilha de Okinawa

Uma pequena e encantadora ilha onde seus moradores, denominados Uchinanchu, vivem saudáveis e em paz consigo mesmo, só se aposentando depois dos 80 anos. Um local onde inexiste o estresse e raras são as doenças de câncer e do coração. Essa é a Ilha de Okinawa.

Os sempre simpáticos Uchinanchu possuem alguns segredinhos para serem felizes, nada tão complicado assim, como poderemos constatar. As grandes respostas estão nas coisas mais simples. Vejamos quais são elas:

Manter-se ativo

Dizer “não” à vida sedentária, mesmo após a aposentadoria. Continuar desenvolvendo alguma atividade, profissional ou não, mesmo que seja um “hobby” ou trabalho voluntário. Com isso, você está aplicando o conceito de Ikigai, que seria definido algo como “ter uma razão para se levantar todas as manhãs, com alegria e disposição”. É estar de bem com a vida!

Não se estressar

É um recado aos paulistanos, moradores da Capital de São Paulo. Vá com calma, o estresse não faz bem para a saúde, ao contrário. Sabe-se que o estresse contínuo faz com que se reduza a nossa concentração, nossa memória e até a vida sexual fica prejudicada. Os habitantes de Okinawa ensinam que um dos segredos da vida é justamente fazer cada coisa ao seu tempo. Dormir bem, manter o ambiente ao seu redor em ordem e praticar a meditação são algumas atitudes para desacelerar.

Não se renda ao pecado da gula. Coma menos.

A gastronomia tem um papel fundamental na qualidade de vida dos okinawanos. Acostume-se a uma dieta saudável, à base de muitas frutas, legumes e peixes. Adquira o hábito do hara hachi bu, que significa que uma pessoa deve comer até se sentir 80% saciada, para limitar a ingestão de calorias. Os okinawanos consomem mais soja do que qualquer outra população da terra. A soja é rica em flavonoides. Tome diariamente uma xícara de chá verde.

Desenvolva a amizade

Procure criar vínculos próximos e sinceros com os vizinhos; desenvolva laços fortes dentro da sua comunidade, como se fossem uma verdadeira família.

Busque criar esse sentimento de pertencimento e de ajuda mútua. É sentir-se parte da comunidade, de ser importante e valorizado. É isso que dá sentido à vida e ajuda a aumentar a expectativa de vida de todos.

Atividades físicas

Evitar o sedentarismo, fazendo exercícios simples como caminhar diariamente, prescindindo o uso de transporte; usar a bicicleta para trabalhar. Ser otimista, não complicar a vida.  

Contato com a natureza

Os okinawanos procuram cultivar uma horta ou até uma pequena plantação de verduras, chás e mangas, interagindo com a natureza.

Otimismo

Os pesquisadores constataram que os idosos da Ilha costumam sorrir sempre, até nas filas em supermercados e diante de pessoas estranhas, mostrando sempre uma atitude positiva e acolhedora perante a vida. Isso é decorrência, em parte, porque eles se sentem valorizados como indivíduos, mesmo quando idosos, beneficiando fortemente sua saúde mental e fisiológica.

Gratidão

Em Okinawa, as pessoas dedicam um tempo de seus dias a agradecer o momento presente, buscando eliminar as emoções negativas e se focar apenas no que há de bom. Segundo o testemunho do amigo Dinho que já esteve lá, foi emocionante constatar a calorosa recepção com a qual os idosos okinawanos recebem os visitantes, principalmente quando se tratam de nikkeis brasileiros. Com um efusivo e caloroso aperto de mãos, foram tratados como se fossem parentes retornando à Pátria, como heróis. Verdadeiramente tocante!

Os diversos estudos e pesquisas revelam que, de forma unânime, a fórmula da longevidade em Okinawa, onde vivem esses extraordinários longevos, se sustenta em três pilares básicos: a atividade física diária, um ritmo de vida relaxado, para não dizer tranquilo e uma boa e saudável alimentação.

Okinawanos no Brasil

É expressiva a participação dos descendentes uchinanchu no Brasil. Seguramente, formam a maior comunidade fora do Japão, onde São Paulo abriga cerca de 70% dos okinawanos aqui radicados.  São 150 mil pessoas, entre imigrantes e descendentes e trazem todos eles as marcantes características que ressaltam o estilo de ser uchiná: o espírito coletivo e o jeitão alegre e participativo.

Uchinanchu Takiai em Okinawa, 2016

A tradição, a cultura e os costumes são mantidos até hoje pela nova geração de descendentes, através da realização de grandes eventos que procuram valorizar e destacar a música, as danças típicas, as artes, a culinária.

Pode-se afirmar que os okinawanos, com seu jeito de ser alegre e expansivo, espírito comunitário e até por uma característica física, ser mais moreno que os demais nikkeis, se integraram tão bem à sociedade brasileira, que se destacam claramente em várias atividades, como comércio, política, esportes, artes e até na miscigenação racial que vem ocorrendo por parte de seus descendentes.

Desconheço estudos sobre a longevidade dos okinawanos no Brasil, mas não estarei errando se afirmar que está dentro do desempenho dos demais nikkeis brasileiros da Terceira Idade, que estão a viver cada vez mais e melhor.

Embora não seja uma okinawana e nunca tenha posto os pés na ilha famosa, a Sra. Aiko, japonesa da Província de Yamaguchi, com seus quase 99 anos, quando perguntada sobre sua idade tão avançada, dá de ombros sobre uma possível influência genética e responde de forma contundente: “O segredo é trabalhar, não se acomodar! Acordar cedo, cuidar das obrigações de dona de casa e conversar bastante, fazer amizades. Mas, também gosto de sair, passear, viajar de vez em quando e comer em restaurantes! Ainda bem que tenho filhos, noras e netos que me propiciam esses prazeres”, termina ela com uma sonora gargalhada.

Para orgulho deste escriba, D. Aiko é minha mãe!

Seja na Ilha de Okinawa, com a sua magia e encanto, como aqui, em nosso Brasil tupiniquim, como mostra a D. Aiko, viver mais e melhor é questão de atitude perante a vida. E, acima de tudo, de cercar-se de pessoas felizes e cultivar amizades!

Ichaariba choode (uma vez que nos encontramos, somos irmãos)

Yuimaru (os laços inexoráveis da solidariedade okinawana)  

PS: Meus agradecimentos ao amigo Carlos “Dinho” Ianase pela cessão das fotos que emolduram o despretensioso texto. Encantado pelo fascínio da Ilha de Okinawa, fiquei sabendo que ele pretende revisitá-la no próximo ano. É um privilegiado!

 

© 2019 Katsuo Higuchi

About the Author

Natural de Tupã – SP, nissei, formado em Direito com Especialização em Relações Trabalhistas. Durante 50 anos atuou como Executivo e Empresário na área de Recursos Humanos. Consultor Empresarial, é  também Colunista do Jornal Nippo Brasil.

Atualizado em junho de 2017

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