Como nissei, tenho orgulho de minhas origens e valorizo demais os princípios e valores que recebi de meus avós e de meus pais, os quais, apesar da simplicidade e da vida sofrida e humilde que tiveram, transmitiram-nos conceitos valorosos sobre honestidade, dedicação, disciplina. E, a admiração pela cultura japonesa. Causa-me desconforto, por consequência, qualquer notícia sobre desentendimentos, insatisfações e conflitos que envolvam a população nipo-brasileira no Japão.
Com o advento do fenômeno “dekasseguis” iniciado há mais ou menos 30 anos atrás, sempre me preocupei com a problemática da integração dessa comunidade nipo-brasileira “em trânsito” dentro da sociedade japonesa, sabidamente rígida, formal e de pouca flexibilidade. São inúmeros os exemplos de tratamento preconceituoso e até de discriminação sofridos pelos brasileiros, apesar do fenótipo, do próprio sobrenome e da consanguinidade japonesas que possuíam. Para todos os efeitos, no Japão, os “nikkeis” são considerados brasileiros e não japoneses. Esses conflitos ocorreram com muita frequência nas fábricas, principalmente nos primeiros anos da migração brasileira, período no qual milhares de “nikkeis” buscaram o País do Sol Nascente como uma tábua de salvação, um novo Eldorado. Não acostumados aos serviços duros e pesados, estritamente operacionais aos quais foram submetidos, somada à dificuldade de comunicação por não dominarem o idioma japonês e agravado pelo tratamento duro, frio e nada cortês dos gestores nativos, os brasileiros quase entraram em colapso, somente superado pelo orgulho próprio e pela extrema necessidade financeira, que os levaram para lá. Houve uma sensível melhora nesse “status quo” nos últimos anos, pela conscientização dos dirigentes e gestores, pela interferência das autoridades e pela repercussão do assunto na mídia em geral.
Outra grande preocupação sempre foi a da educação das crianças brasileiras no Japão, algumas que nasceram no próprio país, crianças cujos pais eram tomados pela grande dúvida, preocupados em oferecer uma melhor educação para os filhos. O que seria melhor: colocá-los em escola brasileira ou em escola japonesa? É sabido que as escolas brasileiras têm deficiência em sua estrutura e são mais caras e as japonesas têm uma grade escolar mais puxada, são rigorosas, mas é a porta de entrada para um futuro melhor, por preparar a criança dentro dos princípios, regras e costumes valorizados pela sociedade japonesa, além de possibilitar a fluência no idioma local.
Entretanto, e lamentavelmente, sabe-se que ainda ocorrem casos de “ijime/bullying” em algumas escolas japonesas, onde o regime disciplinar costuma ser bastante rígido. Os maus tratos ocorrem por parte dos professores e funcionários e, principalmente, a partir dos próprios colegas que, de forma preconceituosa contra o aluno “nikkei”, isolam-no ou o ridicularizam. Mesmo nascidos no Japão, os brasileiros são tratados como “estrangeiros”, não importando se dominam a língua japonesa e se adaptados à cultura e à sociedade japonesa.
O choque cultural também chega ao nível dos pais brasileiros que, quando convocados pela direção da escola para tomar conhecimento de eventuais ocorrências com o filho na escola, já se deparam com as dificuldades na comunicação para inteirar-se do ocorrido por falta de fluência no idioma japonês, e também pela atitude preconceituosa, de soberba e de pouca boa vontade que caracterizam os pais nipônicos, ressaltando a diferença de cultura existente. Essa postura gera conflitos de adaptação e de identidade, pela não aceitação por parte dos nativos.
De todo esse cenário complicado deduz-se que o grande desafio às gerações atuais e próximas dos filhos de imigrantes brasileiros é buscar, através do diploma universitário ou mesmo de um curso técnico, o caminho mais seguro para a afirmação pessoal, a ascensão social e o sucesso. Felizmente, temos exemplos de inúmeros jovens que já conseguiram atingir esse objetivo e hoje, além de perfeitamente integrados à sociedade, estão muito bem colocados profissionalmente.
“Quem supera a si mesma, supera o mundo!”
—Dra. Luciane Patrícia Yano-Psicóloga
Nota:
1. "CPI debate problemas dos brasileiros que vivem no Japão" - Senado Noticias, Fevereiro 12, 2005.