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Japão X Brasil?

No esporte mais popular do Brasil, torço para o Japão (Foto: Henrique Minatogawa)

Em agosto, acontecerão os Jogos Olímpicos de Verão no Rio de Janeiro. Os atletas estão se preparando para competir, enquanto eu estou me preparando para novamente responder à pergunta: “você vai torcer para o Brasil ou para o Japão?”.

Não é algo me chateie, pois é natural, em um país que recebeu muitos imigrantes, que seus descendentes também torçam para o país de seus ancestrais em competições esportivas. Quando tem Copa do Mundo, é a mesma coisa. As comunidades se reúnem para assistir aos jogos tanto do Brasil como da sua terra de origem.


Esporte mais popular

No Brasil, o futebol masculino é, disparado, o esporte mais popular. A primeira Copa do Mundo de que me lembro é a de 1986 – tinha apenas 6 anos. Lembro de ter visto os dois últimos jogos do Brasil. Entendia o que era vitória ou derrota, mas não torci naquela ocasião. Diferentemente de 1990 e 1994, em que torci muito. Afinal, já mais velho, passei a me interessar pelo esporte, assim como praticamente todo menino da época.

Na Copa de 1998, na França, surgiu um novo fator: pela primeira vez, o Japão disputaria uma Copa do Mundo. Foi também quando começaram as perguntas: para quem você vai torcer? Minha resposta padrão era que torceria para os dois até que houvesse um confronto direto; caso houvesse, resolveria na hora.

Em 2002, na Copa do Japão e Coreia do Sul, o time japonês apresentou melhora no desempenho, com gols e vitórias. Ao mesmo tempo, minha torcida também aumentava. Paralelamente, a satisfação de ver a Seleção Brasileira começava a cair. Até esse momento, no entanto, Brasil e Japão ainda não haviam se encontrado em campo.

Nove anos antes, em 1993, o São Paulo Futebol Clube disputou com o Milan o Mundial Interclubes no Estádio Olímpico de Tokyo. Em uma faixa, lia-se “Em 2002, queremos nos encontrar aqui”, em alusão à Copa do Mundo. Lembro que fiquei muito impressionado com tanta antecedência, ainda mais porque falar “ano 2000” soava como algo futurista.

Na Copa seguinte, 2006, na Alemanha, o Brasil chegava como campeão, ou melhor, pentacampeão. O time brasileiro foi muito criticado pela postura acomodada e com excesso de confiança, que resultou na eliminação precoce. Nesse torneio, Brasil e Japão finalmente caíram no mesmo grupo. Resultado, 4x1 para o Brasil. Nesse jogo, percebi que já estava torcendo totalmente para o Japão no futebol.

Nas Copas de 2010 e 2014 (realizada no Brasil), eu usava a camisa da Seleção do Japão para ir trabalhar e passear. Ninguém achava ruim – mesmo porque, nessas ocasiões, não foram adversários diretos.


Apenas pelo esporte

Época de Jogos Olímpicos é legal porque sempre tem alguma disputa na TV. Com tantas modalidades e tantos atletas, é difícil conhecer todos.

Diferentemente do futebol em Copa do Mundo, no caso das Olimpíadas, minha torcida é bem equilibrada entre Brasil e Japão, além de não se limitar a estes dois países. É um tipo de competição que, fora uma ou outra exceção, comporta torcida múltipla.

Nos Jogos Olímpicos, a torcida às vezes acaba se estendendo para atletas de outros países orientais, como Coreia e China. No Brasil, orientais são minoria e pouco aparecem na TV e outros meios de comunicação. Em seguida, torço também para os sul-americanos, afinal, são vizinhos de continente.

Nas Olimpíadas de Inverno, a participação brasileira é muito pequena. Assim, a torcida se concentra para o Japão. Gosto de assistir à patinação artística, salto de esqui, bobsled e o curling.

No fim, o mais importante mesmo é apreciar o esporte bem praticado. Há quem goste de torcer para o mais fraco que se supera pelo esforço, e quem aprecie a vitória do atleta ou time dominante que teve competência para chegar a ser o melhor.

O fato de as próximas Olimpíadas serem no Japão, em Tokyo, certamente terá relevância para as relações entre Brasil e Japão. No encerramento dos Jogos no Rio de Janeiro, já deverá acontecer uma apresentação da próxima sede.


Hino japonês 

Foi por meio das cerimônias de eventos esportivos que aprendi o hino nacional do Japão, o “Kimigayo”. É curioso que o hino nacional brasileiro tem aproximadamente 3 minutos de duração – nos eventos transmitidos na TV, toca-se apenas metade dele – enquanto o do Japão não chega a 1 minuto.

Saber a letra do hino foi importante em algumas ocasiões. Nas comemorações do centenário da imigração japonesa, em 2008, o hino foi constantemente executado, assim como em eventos de associações nikkeis. Ajudei algumas pessoas que não sabiam e expliquei (aproximadamente) o significado.

O mesmo acontece com a Hinomaru, a bandeira do Japão. A imagem do círculo vermelho no fundo branco já é bem conhecida no Brasil. Durante eventos esportivos, a exposição é maior, assim, muitos também perguntam qual o seu significado.


Afinidade

Torcer para um time ou para algum atleta é algo emocional. Existe, neste caso, uma afinidade óbvia em razão da ancestralidade. Mesmo que pouco ou nada saibamos a respeito do atleta, apenas o fato de ser da terra dos nossos avós é motivo suficiente para criar uma afinidade.

Ainda existe o fator da representatividade. No Brasil, a população nikkei é relativamente pequena (1% do total). Nas modalidades esportivas mais populares no país, é muito raro haver um nikkei. Dessa forma, a simples menção de um sobrenome japonês já atrai naturalmente a torcida – mesmo que geralmente seja pronunciado erroneamente pelos narradores locais.

A torcida que envolve representação nacional felizmente não costuma gerar reações violentas. Assim, se um brasileiro torce para outra seleção, o máximo que pode receber em resposta (até hoje, pelo menos) é alguma brincadeira.

O time japonês atrai torcida mesmo entre os não descendentes (desde que não contra o Brasil). O conceito que se tem dos atletas japoneses no Brasil é de que compensam uma eventual falta de habilidade com esforço e concentração. Ainda, as imagens dos torcedores japoneses recolhendo o lixo após as partidas na Copa do Mundo de 2014 tiveram impacto positivo nos brasileiros – pena que o efeito foi temporário.


Segundo time

Quando eu uso minhas camisas da seleção do Japão, ninguém estranha. A maioria até elogia as cores e o design. Mesmo assim, por precaução, não usaria após uma eventual vitória japonesa sobre o Brasil.

Admito que existe a possibilidade de essa torcida pelo Japão ser interpretada de outra forma. No Brasil, o nikkei já é visto como estrangeiro; andar por aí com a camisa da Seleção do Japão só reforçaria essa imagem, alguém poderia pensar.

Penso que não tem problema algum. O Brasil é um país com grande participação de imigrantes em sua composição. Assim, boa parte dos brasileiros tem suas raízes familiares na África, Europa, Ásia… Temos a sorte de poder usufruir duas (ou mais) culturas e também torcer para dois times, para mais atletas. No fim, torcemos para tanta gente que a apreciação do esporte se torna mais rica.

 

© 2016 Henrique Minatogawa

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About the Author

Henrique Minatogawa é jornalista e fotógrafo, brasileiro, nipo-descendente de terceira geração. Sua família veio das províncias de Okinawa, Nagasaki e Nara. Em 2007, foi bolsista Kenpi Kenshu pela província de Nara. No Brasil, trabalha na cobertura de diversos eventos relacionados à cultura oriental. (Foto: Henrique Minatogawa)

Atualizado em julho de 2020

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